domingo, 11 de outubro de 2009

Criações artísticas - Arte como processo

Resistência

Clébia Lúcia

Primeiro, uma sandália que me atrai num momento de distração dentro de um ônibus a espera do horário para voltar para casa. Acredito que ela me chamou a atenção pela sua beleza, com suas pedras coloridas: verde, vermelha, azul e laranja, que realçavam muito bem no pé da dona. Segundo, a folha seca caída no chão que atrai meu olhar e me faz refletir de como a vida é bela e perfeita, e tudo tem sua funcionalidade.

Ao observar as duas situações, senti que contemplava o belo e as boas sensações que eles proporcionavam, sem pensar muito na sua essência. Fiquei sem saber o que poderia fazer a partir daí. Talvez uma pintura em tela com elementos em alto relevo, folhas secas coladas na composição da pintura, pedras coloridas, coisas desse tipo.

Assisti o filme “Mauá, o Imperador e o Rei” no qual o personagem Mauá, um visconde, presenteava seu escravo com um par de calçados, como símbolo de liberdade da escravidão. Com esta imagem, a idéia de fazer a tela foi reforçada. A tela seria composta por imagens de fundo retratando o sertão nordestino, e por imagens de escravos sendo castigados em primeiro plano. Ou ainda um tronco colado no desenho simbolizando a escravidão. Ao redor do tronco seriam coladas miniaturas de chinelinhos de couro e de chapéu. Os chinelinhos representariam à liberdade dos escravos e sua resistência. Por outro lado, também representariam um símbolo de proteção para o povo nordestino que também vive uma escravidão imposta pelas condições de vida que levam.

Pensei em recorta a imagem do sertão nordestino em vários pedacinhos e depois colá-los em uma base aleatoriamente, preenchendo com tinta os espaços que ficariam entre os pequenos pedaços e fazer uma espécie de escultura, colocando um tronco e chinelos sobre a base pronta. Mas, não foi bem isso que saiu.

Resolvi, então, pintar a base primeiro com diversos tons de tinta para só depois colar os fragmentos da imagem. Ao misturar as tintas fui percebendo as novas tonalidades que iam surgindo e compondo um desenho abstrato. Ao terminá-lo, vi que não necessitaria mais de imagens, pois o trabalho realizado já representava o que eu gostaria que fosse.

Os tons escuros me fizeram lembrar os locais onde os escravos eram castigados, perdendo sangue e na maioria das vezes a própria vida. Os tons verdes, azuis e amarelos me fizeram lembrar do nosso nordeste brasileiro, onde a cada inverno o nordestino renova as suas esperanças com o verde das plantações à espera de melhoria de vida. Trabalham, trabalham e a melhoria nunca chega.

Vivem escravos da sua própria esperança e nem parece que são livres para fazer suas escolhas, já que os mesmos não conseguem viver longe deste sertão. Os chinelos é que protegem os pés de quem tanto luta pela sobrevivência em meio às sucessivas secas e às precariedades do sertão nordestino.

6 comentários:

rosa amelia disse...

Está de parabéns, ficou lindo seu trabalho, com certeza os alunos vão adorar com estas artes nas salas de aula.

Rita Cácia Fernandes disse...

Clébia você ilustrou bem a precaria situação dos nordestinos, bem como sua bravura. Exelente trabalho!
Parabéns!

Mari disse...

Oi Clébia!
Ao ver as fotos em seu blog, fiquei encantada com a obra de arte que você criou. Depois resolvi ler o texto e percebi que tinha tudo a ver com a arte.E esta comparação com os escravos e os nordestinos, nos permite fazer uma viagem fantástica pelo tempo e pela realidade em que muitas vezes deixamos de observar com um olhar mais atento.
Adorei poder fazer esta viagem!
Parabéns, bjos

Rita Rezende disse...

Sua criaçõa vai além do daquelas quatro paredes.Trabalho perfeito!
Parabéns!!

sil disse...

Clébia achei fantástico a viagem que você fez para depois chegar a esse belo tabalho.parabéns!

Joana disse...

Clébia tua criação ficou bem legal. gostei.